Uma dose de amor próprio, por favor

 Eu devia ter cinco anos, quando minha professora de balé me disse que apesar do meu talento, talvez eu devesse procurar outro tipo de dança, já que com o meu biotipo nunca poderia ser uma bailarina. Juro que tentei fingir que não doeu e engolir meus sentimentos de frustração, raiva e decepção. Mas aquilo era só o início de algo que iria fermentar e crescer nos anos seguintes, de certa forma me ajudando a me tornar do jeito que sou e como me sinto a respeito do meu corpo. 

Eu nunca fui uma criança gorda. Sempre ativa, mas mesmo assim isso não impediu que meu corpo fosse diferente dos padrões. Talvez se tivesse sido criada de outra forma, demorasse mais a ver e ansiar tanto por satisfazê-los.     

Aos oito anos lembro de ouvir os conselhos da minha mãe sobre a importância de perder qualquer sobrepeso antes de menstruar, já que depois era tão mais difícil.      

Aos doze parei de usar biquíni ou maiô na frente dos outros, embora nada estivesse errado com o meu corpo. Ele era apenas diferente. Mas como eu odiava isso, e me odiava. Cada centímetro passava por um escrutínio e julgamento exagerados. Como se eu não fosse o suficiente a não ser que alcançasse um certo número na balança.        

Não havia nada que minha mãe temesse mais do que ter filhos gordos. Ela sempre justificou dizendo que era porque não queria que vivêssemos o que ela viveu. Mas quando você aprende desde tão cedo a condicionar o seu valor à sua aparência e ao seu peso, é uma estrada tortuosa, solitária e que vai minando toda e qualquer auto estima.          

E não importa quantas dietas, quanto exercício, quanto peso você perca, você sempre tem uma visão negativa de si. Como se não fosse o suficiente. Mas eu quero ser. Por mais difícil que seja, quero ser mais gentil com a pessoa que vejo no espelho. Celebrar o corpo que me permite fazer tanto, aceitar que existem mudanças que posso atingir e outras que talvez não, mas que isso não me torna pior, só diferente. E que diferenças podem e são boas. Diferença de formas, pesos, mentalidades, estilos, personalidades… São elas que nos tornam únicos.          

O caminho da aceitação e do amor próprio talvez seja o mais cheio de altos e baixos que já percorri. Não existe uma saída fácil. Simplesmente é ou não é. E eu ainda não cheguei lá. Mas sei que enquanto não chegar, não vou conseguir amar nem receber amor de verdade. Vou sempre estar em busca de algo que falta e que só eu posso me dar.          

Se eu pudesse, voltaria no tempo e abraçaria a criança que fui e deixaria claro que não há nada de errado com ela. Mas eu não posso. Só posso tentar me reeducar, pra que a mudança venha de dentro pra fora e algum dia enfim, eu fique a vontade na minha própria pele.            

O que eu (re) descobri na Quarentena

Não, este não é um daqueles textos dizendo pra você focar no positivo e como é necessário o mundo desacelerar (olha, os animais estão voltando e a natureza agradece, e coisas do tipo).  Eu me preocupo, me pergunto que tipos de mudanças teremos a curto e longo prazo… Porque pra muita gente, não sair para trabalhar e/ou praticar isolamento social dentro da sua própria casa, não é uma opção viável. É a desigualdade social dando mais um tapa na nossa cara e mostrando que talvez ela seja a doença mais grave.        

Com um governo caótico, medidas insuficientes, o sistema de saúde sobrecarregado, como faz?        

Estou há 53 dias em quarentena. E entendo o privilégio que é ter um espaço seguro. Mas isso não significa que sempre é fácil. São dias de desinformação ou bombardeio de notícias que você precisa questionar. Pânico e incerteza não combinam bem.          

E em meio a tudo isso, vou fazendo o possível. Entendendo o que funciona pra mim e o que talvez seja melhor em um outro momento, quando não estivermos numa pandemia mundial. 

 1) Livros realmente são grandes aliados. E eu fazia tempo não lia tanto e com tanta vontade. 

2) Séries e filmes são uma boa alternativa para escapar da realidade, mas não podem ser as únicas. Se afundar na cama ou sofá por tempo indeterminado podem te deixar ainda mais deprimido e sem energia. 

3) Plantas e ter algo que te obrigue a fazer algo rotineiramente são ótimas. Impressionante como o verde deixa ambiente fica mais leve.

4) Exercícios são um pouco mais complicados…Tem dias que me fazem um bem enorme e outros em que quero gritar com qualquer pessoa falando sobre o treino do dia.

 5) Cozinhar ( não, eu ainda não fiz meu próprio pão, mas confesso que estou com vontade) tem sido uma surpresa ótima e uma puta fonte de prazer. Eu que sempre fugi do fogão, tenho me descoberto e me divertido fazendo receitas e combinações. 

6) Relacionamento: não é fácil viver uma pandemia, mas nessa hora fico muito feliz de ver que tenho uma parceria no bom e no ruim. Claro que alguns dias são mais complicados, mas com um pouco de bom humor e carinho, a gente resolve. 7) Trabalho é um pouco difícil, mas outro dia li algo que dizia “tudo bem não conseguir ser produtivo um dia”, afinal são tempos extraordinários e às vezes é complicado equilibrar tudo e focar.      

Mas acho que a coisa mais constante durante todo esse período, foi entender a importância do equilíbrio. Não é novo, não é revolucionário, mas tem sido um exercício importante pra mim.      E por aqui seguimos em quarentena, isolados, mas conectados. Torcendo por dias melhores. Afinal, tudo passa. 

Muito Prazer: Kamille Viola

Nesta seção do blog, vou entrevistar pessoas que acho interessantes não só por sua personalidade, mas pela maneira como usam suas plataformas para criar impactos positivos. Espero que através deste perfil, vocês possam conhecê-los um pouco melhor e quem sabem se inspirem a procurar um pouco mais sobre o trabalho incrível que cada um deles está fazendo. Juntos somos mais sempre!

Para estrear a seção, convidei a jornalista Kamille Viola, que deixou bem claro, estar muito mais acostumada a entrevistar do que a responder perguntas. Mas foi muito gentil e se prontificou a abraçar o projeto. Aqui, deixo vocês com um pouquinho desta conversa. Fiquem à vontade para ler tomando um café, um suco ou como fariam num bate-papo gostoso quando vão conhecer alguém.

Muito Prazer: Kamille Viola

Como começa o seu dia?
A não ser que eu tenha pauta logo cedo, acordo, ouço um áudio que é uma espécie de meditação diária (de uma mulher chamada Paty Nunes, ela tem um canal no YouTube), tomo café, tomo banho e vou pro computador (meu escritório é na minha casa). Se tenho uma entrevista ou algo do tipo, pulo etapas (risos). Esta semana comecei na academia, então depois de tomar café eu passo lá. Como meu dia de trabalho vai até mais tarde (costuma ser assim nas redações também), não atrapalhou.

Você tem algum ritual ou rotina no seu processo criativo/de trabalho?

  Costumo dar uma olhada nas redes e em sites com matérias de cultura/comportamento pra ver se tem alguma novidade. Também depende do trabalho do momento. Nos últimos tempos tive que ler vários livros e fazer pesquisas no acervo da Biblioteca Nacional.

Duas pessoas que te influenciaram muito na sua jornada (pode ser pessoal ou profissional) e o porquê. 

Um é o Alvaro Costa e Silva, jornalista de cultura e meu amigo. Uma pessoa criativa, engraçada, com um texto delicioso. O Marechal, como ele é chamado pelos amigos, é um daqueles jornalistas de uma linhagem que eu creio que esteja em extinção, ele próprio um personagem, talentosíssimo, muito culto, conhece todo mundo, foi amigo de grandes nomes da nossa música. Um talento e tive a sorte de me tornar amiga dele, que me incentivou em diversos momentos. Brinco que ele é o meu oráculo, porque sempre que tive alguma dúvida e recorri ao Marechal ele tinha a resposta. Outra é a Karla Rondon Prado, também jornalista, que foi editora-executiva do jornal O Dia e minha chefe durante dez anos. Devo a esse tempo no Dia quase tudo que sei sobre trabalhar em redação, e foi muito importante observar a Karla, uma mulher tendo que se impor em um meio dominado pelos homens , o que não é nada fácil. Foi a pessoa que me deu minha primeira chance em um grande veículo, e sou grata por isso. Além disso, durante alguns anos (já não me lembro quantos) tivemos um blog de cultura juntas, o Pós-Pop, e foi uma experiência muito enriquecedora também.  

Um disco que te marcou. 
São alguns, mas vou escolher o “Força bruta”, do Jorge Ben. Eu já gostava do Jorge por causa dos sucessos, o primeiro disco dele que eu tinha ouvido tinha sido o LP do “A Banda do Zé Pretinho”, que eu tinha pedido emprestado a um conhecido, nos anos 90. Anos mais tarde, comprei em um sebo alguns CDs do Jorge, daquela série “Colecionador”. De cada um eu conhecia um pouco: o “Força bruta” eu levei por causa daquela música “O telefone tocou novamente”, que eu adorava. Viciei no disco e no Jorge, passei a pesquisar a vida dele, acabei conhecendo ele, entrevistando ele (o que é sempre muito difícil), hoje conheço (e tenho) praticamente toda a obra dele. 

A melhor comida do mundo é…
A da minha avó. Pena que recentemente ela tenha parado de cozinhar (acabou de fazer 98 anos!). Sério, a minha avó fez vários cursos de culinária e fazia receitas maravilhosas, com técnicas francesas, além das receitas italianas da família dela etc. Foi ela também que me ensinou a cozinhar, quando eu era criança. Se for pra escolher um prato não sei, mas acho que comidas com amor e que lembrem o que a avó da gente fazia. 

Eu escolhi pessoas para entrevistar cujo o trabalho me tocou de alguma maneira. Seja pela criatividade, por unirem engajamento social e trazerem luz à assuntos importantes de forma leve, mas sempre presente. Pessoas que independente da área, representam e acreditam em serem agentes de mudança. Neste tom, queria perguntar como define seu trabalho e falasse um pouco sobre o que significa para você promover mudanças. 

É difícil falar sobre meu próprio trabalho dessa forma… Eu sou originalmente jornalista de cultura (comecei falando de música) e uns anos depois comecei a escrever sobre gastronomia também, o que sigo fazendo. Depois que virei freelancer passei a fazer também matérias de comportamento, sobretudo as voltadas para mulheres. Não sei se meu trabalho de fato promove mudanças, mas espero que de alguma forma promova. Procuro dar visibilidade a personagens ou temas que acredito que mereçam essa visibilidade. Desde temas mais densos, como a questão da mulher, aos mais leves, como captar alguma tendência na gastronomia, por exemplo. Tenho algumas premissas, como tentar humanizar personagens e tentar incluir pessoas negras no máximo de pautas que eu puder, porque em geral elas são minoria nesses espaços. 

O seu trabalho é sua forma de…
 Realizar algo que eu gosto muito, que é escrever, falando sobre assuntos que acho relevantes. 

Uma entrevista que fez que foi um divisor de águas pra você. 

Não sei se teve alguma entrevista que tenha sido um divisor de águas, mas fiquei feliz em entrevistar o Jorge Ben Jor e o Chico Buarque, duas pessoas pouco acessíveis para a imprensa. Agora, sem dúvida, cobrir as manifestações seguintes à morte da Marielle Franco, tendo entrevistado a própria, foi algo que me marcou muito. Eu tinha feito parte da entrevista com ela dentro do carro, logo que ela tomou posse (janeiro de 2018), e quando ela foi morta a lembrança daquele dia vinha toda hora à mente. Fiquei muito chocada com o assassinato dela, mas cobrir as manifestações seguintes ao crime me deu um sopro de esperança. Foi bonito ver a capacidade de mobilização das pessoas. 

Realmente momentos como esse fazem a gente ter esperança. E como estamos precisando de esperança ultimamente…

Outra coisa bem legal que você faz é colaborar com vários sites, blogs e revistas, seja conversando com a Lorenna Vieira, namorada do DJ Rennan da Penha e trazendo foco sobre a questão da criminalização do funk, ou usando sua plataforma para falar de projetos musicais que acredita ou entrevistando ícones seus como o Martinho da Vila, suas entrevistas também contam um pouco sobre a Kamille. 

Explica um pouco como acontece, se você propõe certas pautas para alguns veículos, ou já te buscam com alguma ideia e rola uma colaboração a partir daí. 
 A maioria das vezes eu proponho as pautas que faço, mas de vez em quando faço pautas que os editores me passam (principalmente na Marie Claire).

 Uma pessoa viva ou morta com quem gostaria de jantar.
 De vivas com o Chico Buarque, adoraria ouvir o que ele tem a dizer. Volta e meia, quando acontece algo no no país, eu penso: “O que será que o Chico tá achando disso?” De pessoas já mortas Clarice Lispector, Carolina Maria de Jesus, Serge Gainsbourg…
 

Bem eclética e interessante essa mesa de jantar…

O último livro que leu.
 “Meu caminho é chão e céu – Memórias”, do Dadi, baixista superimportante na história da música brasileira. 

O pior defeito que alguém pode ter.
Nossa, não sei. Ficar feliz com o mal alheio e julgar os outros de forma implacável, talvez.

Uma cidade. ( que já foi e ama e/ou uma que ainda sonha em conhecer)

Nossa, difícil escolher uma só que eu ame… Eu amo adoro viajar e queria ter dinheiro pra fazer isso mais constantemente. Adorei Atenas, onde fui duas vezes, achei o povo grego muito caloroso, meio tipo a gente. Claro que só tive a experiência de turista, mas até fiz duas amigas por lá. Acho o Brasil o lugar mais lindo que já visitei e ando louca pra conhecer Maceió, infelizmente ainda não fui a Alagoas. E também quero ir à África, sou muito curiosa pra ir a Moçambique, Angola e África do Sul. 

Qual a melhor parte do seu trabalho?
A melhor parte do meu trabalho é trabalhar com escrita, meu sonho desde que aprendi a ler e escrever, e falar de assuntos dos quais eu gosto e nos quais acredito. 

E o maior desafio?
 Um dos maiores desafios é conseguir se manter sendo repórter. Na verdade, acho que não daria, estou sobrevivendo porque faço outras coisas, como curadorias, roteiros, pesquisas etc. E o outro é entrevistar pessoas que acabaram de passar por histórias difíceis ou que estão te contando situações traumáticas/injustas, tem vezes que dá vontade de abraçar o entrevistado. A gente tem vontade de resolver a situação da pessoa, mas em geral o que pode fazer é dar visibilidade ao problema dela, tentar fazer com que a comoção em torno da história se reverta em algum tipo de ajuda para aquela pessoa. 

Uma coisa pela qual gostaria de ser lembrada.
Nossa, que difícil! Acho que gostaria de ser lembrada por ter escrito um livro bonito (espero, um dia) e por ter sido uma boa pessoa. Espero ser. 
 

Pra terminar, como seria o seu dia ideal no Rio de Janeiro( você que tem tantas dicas e conhecimento de causa)?Além de ser carioca da gema, dá sempre boas dicas do que se fazer na cidade…

Adoro o Rio, fica difícil escolher uma coisa só! Um programa que adoro é ir à Praia Vermelha e no fim do dia ficar na mureta bebendo e vendo o anoitecer. Aliás, praia é sempre uma boa, e adoro ir no Leme – depois dá pra comer num dos lugares legais que existem pra lá, uma paixão recente é o quiosque do Aconchego Carioca, de noite o S Bistrô (antigo Salomé). Também adoro passear pelo Centro e seus prédios históricos, ir em botecos tradicionais como a Casa Paladino, passar no CCBB, no Real Gabinete Português de Leitura, nas igrejas, na orla Conde… Aliás, adoro simplesmente andar pela rua admirando os lugares dessa cidade. Eu cresci na Tijuca e acho que todo mundo tem que ir pelo menos uma vez na vida na Floresta da Tijuca (meus pais me levavam muito lá na infância, depois de adulta eu fui algumas vezes), depois vale emendar com os botecos maravilhosos de lá, tipo Momo ou Da Gema. Ah, e a dobradinha Bar Brasil + show no Circo Voador, amo! Já andei muito por essa cidade e hoje em dia por comodismo e a correria do dia a dia acabo ficando mais no eixo Tijuca-Centro-Zona Sul, mas o Rio tem coisas legais em todos cantos pra se fazer.

Gostou? Quer conhecer mais do trabalho da Kamille? Ela escreveu esse mês pela Trip, uma matéria incrível sobre o destaque e a mudança de simbologia que vem acontecendo em torno do nome de Exu, graças ao trabalho de artistas como Serena Assumpção, Karina Buhr, Luê, Xênia França e Baco Exu do Blues, entre outros. Vale muito a pena a leitura! Só clicar acima e conferir!

E fiquem de olho para o próximo perfil!

Foto: Bárbara Lopes

Setembro Amarelo: está tudo bem não se sentir bem

Estamos em pleno Setembro Amarelo, pra quem não sabe, uma campanha do Centro de Valorização da Vida iniciada em 2015 em todo Brasil de prevenção ao suicídio. Por isso vamos falar de felicidade compulsória, entre outras coisas.

Bom, basta rolar pelo seu feed e você vai ver muitas fotos felizes, hashtags positivas ou que tratam a existência de um momento ruim como algo de outro planeta (ou melhor da vida de qualquer um menos da sua). Ninguém quer falar, admitir ou abrir um diálogo real sobre não estar tão bem assim. Afinal, isso não é coisa de gente bem sucedida. Não gera likes. Você tem direito a ficar mal um dia, mas no outro é melhor postar uma foto numa paisagem paradisíaca ou com seu pet bem fofo, lembrando a todo mundo que aquilo foi passageiro.

A pressão para sermos perfeitos, termos vidas incríveis, tira a autenticidade das experiências e cada vez mais as pessoas da nossa geração reclamam que já não sentem prazer nessa corrida motivada por resultados e comparações.

Corpos. Empregos. Relacionamentos. Casas. Viagens. Filhos. Tudo é colocado em display num concurso sem fim nem medalhas. Apenas uma tentativa insana de provar o quão feliz você é, mesmo que por dentro esteja desmoronando. Como falar sobre dor, solidão, se até isso as pessoas querem julgar? O setembro pode ser amarelo, mas a depressão, assim como os diversos motivos que levam alguém a considerar o suicídio tem diversos tons. Impossível colocar numa caixa, medir, comparar. Aliás, a primeira coisa a se entender é que dor NUNCA se compara. Precisamos ter mais empatia.

Parar com esses #goodvibesonly e oferecer espaços seguros onde as pessoas possam de verdade se sentir à vontade para conversar, trocar, pedir ajuda. Ninguém vive só de goodvibes nem de bad. É importante passar e reconhecer as mudanças, e acolhê-las. A vida não se resume a um bom filtro de Instagram. E definitivamente não se resolve com ele, não importa o quanto queiramos. Então, que tal fazer um esforço real nesse mês? Nem romantizar o sofrimento com fotos bonitas para ganhar atenção nem ostracizar os que podem estar num momento difícil. Só através da sinceridade e de mostrarmos nosso lado mais vulnerável que tantas vezes fica perdido em meio a tantos artifícios, vamos conseguir promover mudança.

Fale com um amigo. Ouça. Pergunte. Esteja mais presente na vida de quem você conseguir. De verdade. Nem sempre vai ser fácil. Mas vale a pena. Porque em geral, as pessoas que realmente estão precisando de ajuda, nem sempre conseguem pedir essa ajuda. E não deixe só pra setembro.

O começo.

A primeira vez a gente nunca esquece

    Oi, você ainda não me conhece e seria injusto pedir um tempo, como na vida normal, para que me conheça e quem sabe venha a gostar ou não do que tenho a dizer.

    Aqui, agora, no digital, tudo acontece de uma maneira tão acelerada. Consumimos séries inteiras em um único final de semana; escutamos um álbum no repeat, apaixonados, entusiasmados mas o fogo queima até o próximo grande álbum ou descoberta. Não vou nem falar de moda… as fast fashions continuam velozes e furiosas sem se importar com o impacto que tem no meio ambiente e no tecido social. A tentativa do “aluguel de roupas” da Urban Outfitters, chamada de Nuuly, onde você paga de $89,99 a $800 por uma caixa com itens escolhidos de acordo com seu estilo e depois de um tempo pode devolver ou ficar com eles, fala muito mais sobre sua real motivação: continuar vendendo, se escondendo atrás de uma opção “mais consciente” e menos consumista, embora tudo o que querem no final do dia é ver você comprar.

Algumas marcas vem à mente quando falamos sobre usar a ética, o consumo consciente e até as pessoas envolvidas no processo como parte do apelo da marca em seu branding… para logo em seguida ser revelado que não passava de mais uma jogada de marketing. Mais um jeito de fazer dinheiro das pessoas; seja as que trabalham lá e sofreram assédio moral, racismo, gordofobia e tudo o que muitas vezes acontece em marcas de moda, desde pagamentos atrasados, condições precárias de trabalho, racionalização de papel higiênico… e claro, a quebra de confiança do cliente, que busca por opções sérias, éticas, mais humanas de se fazer e comprar moda.

É a era da conscientização mas nunca estivemos tão egoístas, tão ensimesmados, presos em nossas bolhas com celulares, apps que te ajudam a meditar, a malhar, a se conectar sem precisar criar conexões que escapem da tela. Uma curadoria da sua vida que passa a imagem que quiser com uma variedade de filtros a seu dispor que nunca mencionam os problemas de família que você está vivenciando, a briga que teve ontem a noite com seu parceiro depois de uma garrafa de vinho a mais ou que todas as plantas que cultiva não são só porque você quer uma selva urbana, mas ultimamente é mais fácil lidar com elas do que com gente. Mas com o ângulo e a luz certa você garante uma foto da parte da sua vida que quer mostrar. E por que mostrar? Por que dividir?

     Assim quando como me sentei de frente para esta página em branco ( a pior e a melhor coisa para qualquer pessoa que escreve), pensei nos motivos de dividir meus pensamentos, angústias, dúvidas, curiosidades, descobertas, aprendizados, erros, inseguranças… e a única coisa que me vinha à mente é que vivemos tão conectados e a solidão nunca pareceu maior. E existem histórias e pensamentos que precisam ser compartilhados, para que possamos trocar, nos identificar, falar de experiências totalmente distintas, a fim de dialogar. Nunca pensei em fazer isso como um blog, a ideia inicial era outra que não se realizou, mas fico feliz de começar aqui, na página em branco, onde posso ser eu, sem filtros, sem freios, só vontade e ideias que espero aos poucos ir dando forma.

     Sei que é muita coisa para digerir, como disse no começo, é até injusto pedir um pouco do seu tempo quando você já tem provavelmente mil coisas rolando na sua vida pessoal, do trampo pra resolver, aquela(s) série(s) da Netflix

que precisa colocar em dia, ler os artigos que separou para ler depois e ainda não teve chance, terminar o livro que comprou, isso tudo se você não tem filhos, porque aí acrescenta todos os cuidados necessários por um outro ser humaninho nesse job 24h/dia que não termina e que é tão subestimado… Mas injusto ou ingenuidade minha, eu vou pedir.

    Não vou falar “leia quando sobrar aquele tempo”, porque nunca sobra e a gente sabe. Leia como e quando der: no metrô, naquela fila gigante que faz você querer bater seu carrinho em todo mundo e deitar no chão do supermercado, no banheiro (quem nunca?!?), enquanto espera uma consulta marcada (por algum motivo elas sempre atrasam)… O que estou dizendo é que se quiser, talvez no meio de tudo encontre uma brecha, e nesses encontros, quem sabe venha a gostar do que tenho a dizer. E aí, talvez você também tenha, mesmo que seja que não concorda ou que detesta como eu escrevo. Mas hoje, tudo o que quero é te pedir um pouco do seu tempo, e acredita  sei que isso vale mais do que dinheiro (apesar de infelizmente não dar pra pagar boleto). Pensa a respeito. Com carinho, com vontade.

    Se você chegou até aqui neste texto, (você ganhou a estrela púrpura da paciência…)e talvez também esteja buscando algo diferente, apesar dos milhares de blogs, de estrelinhas do Twitter, de Youtubers… e assim como eu se sinta meio perdida com todo o ruído.         

     Sou criadora e consumidora ávida de todo tipo de conteúdo e acredito que isso me ajuda a crescer e aprender muita coisa. Mas chegou a hora de criar conteúdo no qual eu acredito.

     Hoje dou este primeiro passo e início essa nova jornada. Convido todos que estiverem dispostos a embarcar.

Foi Anaïs Nin que disse: ” Eu sinto prazer nas minhas transformações. Eu pareço quieta e consistente, mas poucos sabem quantas mulheres existem em mim”.     

       Prazer,

               Débora

 

 

Imagem: Crédito Vero Romero – Hollywood NDAs