Promising Young Woman

Promising Young Woman, ou Jovem Mulher Promissora, é um filme incrível, mas mais do que tudo, necessário. Uma fantasia de vingança, ou melhor, justiça levada ao extremo dos extremos.

      Imagine humilhar os caras que dizem coisas vulgares e ofensivas enquanto mulheres andam na rua cuidando de sua vida, simplesmente porque podem. Esfregar na cara de homens que se “acham” um dos caras legais o quão escrotos eles podem ser, dada a oportunidade de se aproveitar de alguém em uma situação vulnerável. Oferecer ajuda por interesse e realmente ajudar são coisas bem distintas, que muitos homens parecem não saber ou não ter interesse em entender a diferença. E o que falar de consentimento?  

     Com humor ácido, trilha-sonora recheada de hits, a estética do filme, quase sempre em cores “fofas”, tradicionalmente femininas, pastéis, serve como uma moldura para a ação que se desenrola. O que você faria para vingar alguém que ama? Onde fica o limite?

      Violência, tortura psicológica e diversão a parte, o filme é inteligente em mostrar o que acontece quando uma mulher decide inverter os papéis e se tornar a predadora.

      É refrescante para nós, que sempre fomos criadas para sermos boas garotas, não nos colocarmos em situações vulneráveis ou estaríamos convidando o perigo, ver uma protagonista que usa todos esses clichês misóginos e errados, para justamente exercer sua vingança e realização pessoal.

     Carey Mulligan está perfeita como a perturbada e determinada protagonista que após o suicídio de uma amiga que foi sexualmente abusada e desacreditada, decide dar aos homens um pouco do próprio veneno.

       No Brasil, a cada 11 minutos, uma mulher é sexualmente agredida. Estatisticamente 1 em cada 3 mulheres sofreram ou vão sofrer algum tipo de agressão sexual. Imagine quantas infâncias, vidas, carreiras, sonhos, futuros não serão estilhaçados. Quantas jovens mulheres promissoras não perdemos? É importante mostrar que se reconstruir depois de um trauma desse tamanho é um processo longo, doloroso e não linear. Mas é possível.

      Reconhecer o assédio institucionalizado na nossa sociedade, a necessidade de mudança nas criações de meninos e meninas, equilibrar a balança, educar e emponderar as mulheres é necessário e são passos para um futuro um pouco menos assustador.

      Mas o filme entretém a possibilidade de não termos que esperar tanto. De fazermos justiça com as próprias mãos. Tratarmos do trauma através de terapia intensiva na forma de vingança. E apesar de ser apenas um filme, é extremamente satisfatório, relevante e esperto.

     Durante pouco mais de uma hora, são os homens que devem ter medo. E isso pode não ser o correto, mas é muito bem vindo. E merecido.

Uma dose de amor próprio, por favor

 Eu devia ter cinco anos, quando minha professora de balé me disse que apesar do meu talento, talvez eu devesse procurar outro tipo de dança, já que com o meu biotipo nunca poderia ser uma bailarina. Juro que tentei fingir que não doeu e engolir meus sentimentos de frustração, raiva e decepção. Mas aquilo era só o início de algo que iria fermentar e crescer nos anos seguintes, de certa forma me ajudando a me tornar do jeito que sou e como me sinto a respeito do meu corpo. 

Eu nunca fui uma criança gorda. Sempre ativa, mas mesmo assim isso não impediu que meu corpo fosse diferente dos padrões. Talvez se tivesse sido criada de outra forma, demorasse mais a ver e ansiar tanto por satisfazê-los.     

Aos oito anos lembro de ouvir os conselhos da minha mãe sobre a importância de perder qualquer sobrepeso antes de menstruar, já que depois era tão mais difícil.      

Aos doze parei de usar biquíni ou maiô na frente dos outros, embora nada estivesse errado com o meu corpo. Ele era apenas diferente. Mas como eu odiava isso, e me odiava. Cada centímetro passava por um escrutínio e julgamento exagerados. Como se eu não fosse o suficiente a não ser que alcançasse um certo número na balança.        

Não havia nada que minha mãe temesse mais do que ter filhos gordos. Ela sempre justificou dizendo que era porque não queria que vivêssemos o que ela viveu. Mas quando você aprende desde tão cedo a condicionar o seu valor à sua aparência e ao seu peso, é uma estrada tortuosa, solitária e que vai minando toda e qualquer auto estima.          

E não importa quantas dietas, quanto exercício, quanto peso você perca, você sempre tem uma visão negativa de si. Como se não fosse o suficiente. Mas eu quero ser. Por mais difícil que seja, quero ser mais gentil com a pessoa que vejo no espelho. Celebrar o corpo que me permite fazer tanto, aceitar que existem mudanças que posso atingir e outras que talvez não, mas que isso não me torna pior, só diferente. E que diferenças podem e são boas. Diferença de formas, pesos, mentalidades, estilos, personalidades… São elas que nos tornam únicos.          

O caminho da aceitação e do amor próprio talvez seja o mais cheio de altos e baixos que já percorri. Não existe uma saída fácil. Simplesmente é ou não é. E eu ainda não cheguei lá. Mas sei que enquanto não chegar, não vou conseguir amar nem receber amor de verdade. Vou sempre estar em busca de algo que falta e que só eu posso me dar.          

Se eu pudesse, voltaria no tempo e abraçaria a criança que fui e deixaria claro que não há nada de errado com ela. Mas eu não posso. Só posso tentar me reeducar, pra que a mudança venha de dentro pra fora e algum dia enfim, eu fique a vontade na minha própria pele.            

O que eu (re) descobri na Quarentena

Não, este não é um daqueles textos dizendo pra você focar no positivo e como é necessário o mundo desacelerar (olha, os animais estão voltando e a natureza agradece, e coisas do tipo).  Eu me preocupo, me pergunto que tipos de mudanças teremos a curto e longo prazo… Porque pra muita gente, não sair para trabalhar e/ou praticar isolamento social dentro da sua própria casa, não é uma opção viável. É a desigualdade social dando mais um tapa na nossa cara e mostrando que talvez ela seja a doença mais grave.        

Com um governo caótico, medidas insuficientes, o sistema de saúde sobrecarregado, como faz?        

Estou há 53 dias em quarentena. E entendo o privilégio que é ter um espaço seguro. Mas isso não significa que sempre é fácil. São dias de desinformação ou bombardeio de notícias que você precisa questionar. Pânico e incerteza não combinam bem.          

E em meio a tudo isso, vou fazendo o possível. Entendendo o que funciona pra mim e o que talvez seja melhor em um outro momento, quando não estivermos numa pandemia mundial. 

 1) Livros realmente são grandes aliados. E eu fazia tempo não lia tanto e com tanta vontade. 

2) Séries e filmes são uma boa alternativa para escapar da realidade, mas não podem ser as únicas. Se afundar na cama ou sofá por tempo indeterminado podem te deixar ainda mais deprimido e sem energia. 

3) Plantas e ter algo que te obrigue a fazer algo rotineiramente são ótimas. Impressionante como o verde deixa ambiente fica mais leve.

4) Exercícios são um pouco mais complicados…Tem dias que me fazem um bem enorme e outros em que quero gritar com qualquer pessoa falando sobre o treino do dia.

 5) Cozinhar ( não, eu ainda não fiz meu próprio pão, mas confesso que estou com vontade) tem sido uma surpresa ótima e uma puta fonte de prazer. Eu que sempre fugi do fogão, tenho me descoberto e me divertido fazendo receitas e combinações. 

6) Relacionamento: não é fácil viver uma pandemia, mas nessa hora fico muito feliz de ver que tenho uma parceria no bom e no ruim. Claro que alguns dias são mais complicados, mas com um pouco de bom humor e carinho, a gente resolve. 7) Trabalho é um pouco difícil, mas outro dia li algo que dizia “tudo bem não conseguir ser produtivo um dia”, afinal são tempos extraordinários e às vezes é complicado equilibrar tudo e focar.      

Mas acho que a coisa mais constante durante todo esse período, foi entender a importância do equilíbrio. Não é novo, não é revolucionário, mas tem sido um exercício importante pra mim.      E por aqui seguimos em quarentena, isolados, mas conectados. Torcendo por dias melhores. Afinal, tudo passa. 

Unbelievable, a série de crimes que você precisa assistir

No ar na Netflix, mais do que uma história de crime envolvendo os elementos clássicos de investigação, a série é baseada numa história real divulgada pelos sites ProPublica e The Marshall Project. 
     Mas o grande mérito de Unbelievable, além das performances incríveis está no cuidado que tem em quanto e como mostra.  

Merritt Weaver no papel da detetive que se doa completamente para cada caso, torcendo que um dia suas filhas entendam e Toni Colette como a detetive mais experiente e casca grossa, uma espécie de mentora. Resumindo, a dupla dos sonhos que nunca soubemos que precisávamos, mas como precisávamos. Kaitlyn Dever entrega uma performance sensível e cheia de nuance como a jovem que tem sua história ignorada e desmerecida. Vê-la repetir o ocorrido várias e várias vezes, apenas para ter tudo o que ocorreu com ela ser empurrado de lado dói fundo. E é algo tão corriqueiro, infelizmente, no tratamento de vítimas de assédio, que tem que se provar, se justificar, ter suas vidas e escolhas questionadas como se quem tivesse cometido o crime fossem elas.      

Pra mim, a série ganha muitos pontos e cresce em não fetichizar os ataques. Em tornar um dos focos a importância e a diferença que tratar vítimas, especialmente em um momento tão delicado, com respeito e empatia fazem.     

Continua sendo um seriado de crime, de investigação, mas a violência contra a mulher não é usada para o entretenimento. É incômodo de assistir muitas vezes. Mas se estamos falando de algo como violência sexual, deveria ser. Assim como deveria ficar claro a importância de se acreditar na vítima e de tratá-la com humanidade, empatia e lhe dar espaço, mas assegurando-a de que ela tem com quem contar.       Um olhar refrescante e tão necessário.        

Só quem já passou por isso sabe as dificuldades, despreparos e burocracias do caminho de fazer uma denúncia de estupro. Talvez por isso, tantas mulheres acabem não denunciando.      

Séries como essa são só séries. Mas trazem visibilidade para o assunto e começam diálogos. E mostram um novo olhar : existe muito além do clichê da violência fetichizada que causa gatilhos em tanta gente.      

Talvez seja hora de contar histórias de um ponto de vista mais humano, empático e nesse caso, inovador.      

E as personagens poderiam ter sido detetives homens, mas tem um motivo, seja nas pesquisas, nas reações, nos comportamentos, no machismo institucionalizado, que fez com que duas mulheres lutando por outras mulheres, e acreditando nelas fez toda a diferença.       

Talvez no futuro, a gente chegue em um momento onde todos lutem pela verdade com a mesma empatia. Mas por enquanto, assista Unbelievable e depois conta o que achou.       

Muito Prazer: Kamille Viola

Nesta seção do blog, vou entrevistar pessoas que acho interessantes não só por sua personalidade, mas pela maneira como usam suas plataformas para criar impactos positivos. Espero que através deste perfil, vocês possam conhecê-los um pouco melhor e quem sabem se inspirem a procurar um pouco mais sobre o trabalho incrível que cada um deles está fazendo. Juntos somos mais sempre!

Para estrear a seção, convidei a jornalista Kamille Viola, que deixou bem claro, estar muito mais acostumada a entrevistar do que a responder perguntas. Mas foi muito gentil e se prontificou a abraçar o projeto. Aqui, deixo vocês com um pouquinho desta conversa. Fiquem à vontade para ler tomando um café, um suco ou como fariam num bate-papo gostoso quando vão conhecer alguém.

Muito Prazer: Kamille Viola

Como começa o seu dia?
A não ser que eu tenha pauta logo cedo, acordo, ouço um áudio que é uma espécie de meditação diária (de uma mulher chamada Paty Nunes, ela tem um canal no YouTube), tomo café, tomo banho e vou pro computador (meu escritório é na minha casa). Se tenho uma entrevista ou algo do tipo, pulo etapas (risos). Esta semana comecei na academia, então depois de tomar café eu passo lá. Como meu dia de trabalho vai até mais tarde (costuma ser assim nas redações também), não atrapalhou.

Você tem algum ritual ou rotina no seu processo criativo/de trabalho?

  Costumo dar uma olhada nas redes e em sites com matérias de cultura/comportamento pra ver se tem alguma novidade. Também depende do trabalho do momento. Nos últimos tempos tive que ler vários livros e fazer pesquisas no acervo da Biblioteca Nacional.

Duas pessoas que te influenciaram muito na sua jornada (pode ser pessoal ou profissional) e o porquê. 

Um é o Alvaro Costa e Silva, jornalista de cultura e meu amigo. Uma pessoa criativa, engraçada, com um texto delicioso. O Marechal, como ele é chamado pelos amigos, é um daqueles jornalistas de uma linhagem que eu creio que esteja em extinção, ele próprio um personagem, talentosíssimo, muito culto, conhece todo mundo, foi amigo de grandes nomes da nossa música. Um talento e tive a sorte de me tornar amiga dele, que me incentivou em diversos momentos. Brinco que ele é o meu oráculo, porque sempre que tive alguma dúvida e recorri ao Marechal ele tinha a resposta. Outra é a Karla Rondon Prado, também jornalista, que foi editora-executiva do jornal O Dia e minha chefe durante dez anos. Devo a esse tempo no Dia quase tudo que sei sobre trabalhar em redação, e foi muito importante observar a Karla, uma mulher tendo que se impor em um meio dominado pelos homens , o que não é nada fácil. Foi a pessoa que me deu minha primeira chance em um grande veículo, e sou grata por isso. Além disso, durante alguns anos (já não me lembro quantos) tivemos um blog de cultura juntas, o Pós-Pop, e foi uma experiência muito enriquecedora também.  

Um disco que te marcou. 
São alguns, mas vou escolher o “Força bruta”, do Jorge Ben. Eu já gostava do Jorge por causa dos sucessos, o primeiro disco dele que eu tinha ouvido tinha sido o LP do “A Banda do Zé Pretinho”, que eu tinha pedido emprestado a um conhecido, nos anos 90. Anos mais tarde, comprei em um sebo alguns CDs do Jorge, daquela série “Colecionador”. De cada um eu conhecia um pouco: o “Força bruta” eu levei por causa daquela música “O telefone tocou novamente”, que eu adorava. Viciei no disco e no Jorge, passei a pesquisar a vida dele, acabei conhecendo ele, entrevistando ele (o que é sempre muito difícil), hoje conheço (e tenho) praticamente toda a obra dele. 

A melhor comida do mundo é…
A da minha avó. Pena que recentemente ela tenha parado de cozinhar (acabou de fazer 98 anos!). Sério, a minha avó fez vários cursos de culinária e fazia receitas maravilhosas, com técnicas francesas, além das receitas italianas da família dela etc. Foi ela também que me ensinou a cozinhar, quando eu era criança. Se for pra escolher um prato não sei, mas acho que comidas com amor e que lembrem o que a avó da gente fazia. 

Eu escolhi pessoas para entrevistar cujo o trabalho me tocou de alguma maneira. Seja pela criatividade, por unirem engajamento social e trazerem luz à assuntos importantes de forma leve, mas sempre presente. Pessoas que independente da área, representam e acreditam em serem agentes de mudança. Neste tom, queria perguntar como define seu trabalho e falasse um pouco sobre o que significa para você promover mudanças. 

É difícil falar sobre meu próprio trabalho dessa forma… Eu sou originalmente jornalista de cultura (comecei falando de música) e uns anos depois comecei a escrever sobre gastronomia também, o que sigo fazendo. Depois que virei freelancer passei a fazer também matérias de comportamento, sobretudo as voltadas para mulheres. Não sei se meu trabalho de fato promove mudanças, mas espero que de alguma forma promova. Procuro dar visibilidade a personagens ou temas que acredito que mereçam essa visibilidade. Desde temas mais densos, como a questão da mulher, aos mais leves, como captar alguma tendência na gastronomia, por exemplo. Tenho algumas premissas, como tentar humanizar personagens e tentar incluir pessoas negras no máximo de pautas que eu puder, porque em geral elas são minoria nesses espaços. 

O seu trabalho é sua forma de…
 Realizar algo que eu gosto muito, que é escrever, falando sobre assuntos que acho relevantes. 

Uma entrevista que fez que foi um divisor de águas pra você. 

Não sei se teve alguma entrevista que tenha sido um divisor de águas, mas fiquei feliz em entrevistar o Jorge Ben Jor e o Chico Buarque, duas pessoas pouco acessíveis para a imprensa. Agora, sem dúvida, cobrir as manifestações seguintes à morte da Marielle Franco, tendo entrevistado a própria, foi algo que me marcou muito. Eu tinha feito parte da entrevista com ela dentro do carro, logo que ela tomou posse (janeiro de 2018), e quando ela foi morta a lembrança daquele dia vinha toda hora à mente. Fiquei muito chocada com o assassinato dela, mas cobrir as manifestações seguintes ao crime me deu um sopro de esperança. Foi bonito ver a capacidade de mobilização das pessoas. 

Realmente momentos como esse fazem a gente ter esperança. E como estamos precisando de esperança ultimamente…

Outra coisa bem legal que você faz é colaborar com vários sites, blogs e revistas, seja conversando com a Lorenna Vieira, namorada do DJ Rennan da Penha e trazendo foco sobre a questão da criminalização do funk, ou usando sua plataforma para falar de projetos musicais que acredita ou entrevistando ícones seus como o Martinho da Vila, suas entrevistas também contam um pouco sobre a Kamille. 

Explica um pouco como acontece, se você propõe certas pautas para alguns veículos, ou já te buscam com alguma ideia e rola uma colaboração a partir daí. 
 A maioria das vezes eu proponho as pautas que faço, mas de vez em quando faço pautas que os editores me passam (principalmente na Marie Claire).

 Uma pessoa viva ou morta com quem gostaria de jantar.
 De vivas com o Chico Buarque, adoraria ouvir o que ele tem a dizer. Volta e meia, quando acontece algo no no país, eu penso: “O que será que o Chico tá achando disso?” De pessoas já mortas Clarice Lispector, Carolina Maria de Jesus, Serge Gainsbourg…
 

Bem eclética e interessante essa mesa de jantar…

O último livro que leu.
 “Meu caminho é chão e céu – Memórias”, do Dadi, baixista superimportante na história da música brasileira. 

O pior defeito que alguém pode ter.
Nossa, não sei. Ficar feliz com o mal alheio e julgar os outros de forma implacável, talvez.

Uma cidade. ( que já foi e ama e/ou uma que ainda sonha em conhecer)

Nossa, difícil escolher uma só que eu ame… Eu amo adoro viajar e queria ter dinheiro pra fazer isso mais constantemente. Adorei Atenas, onde fui duas vezes, achei o povo grego muito caloroso, meio tipo a gente. Claro que só tive a experiência de turista, mas até fiz duas amigas por lá. Acho o Brasil o lugar mais lindo que já visitei e ando louca pra conhecer Maceió, infelizmente ainda não fui a Alagoas. E também quero ir à África, sou muito curiosa pra ir a Moçambique, Angola e África do Sul. 

Qual a melhor parte do seu trabalho?
A melhor parte do meu trabalho é trabalhar com escrita, meu sonho desde que aprendi a ler e escrever, e falar de assuntos dos quais eu gosto e nos quais acredito. 

E o maior desafio?
 Um dos maiores desafios é conseguir se manter sendo repórter. Na verdade, acho que não daria, estou sobrevivendo porque faço outras coisas, como curadorias, roteiros, pesquisas etc. E o outro é entrevistar pessoas que acabaram de passar por histórias difíceis ou que estão te contando situações traumáticas/injustas, tem vezes que dá vontade de abraçar o entrevistado. A gente tem vontade de resolver a situação da pessoa, mas em geral o que pode fazer é dar visibilidade ao problema dela, tentar fazer com que a comoção em torno da história se reverta em algum tipo de ajuda para aquela pessoa. 

Uma coisa pela qual gostaria de ser lembrada.
Nossa, que difícil! Acho que gostaria de ser lembrada por ter escrito um livro bonito (espero, um dia) e por ter sido uma boa pessoa. Espero ser. 
 

Pra terminar, como seria o seu dia ideal no Rio de Janeiro( você que tem tantas dicas e conhecimento de causa)?Além de ser carioca da gema, dá sempre boas dicas do que se fazer na cidade…

Adoro o Rio, fica difícil escolher uma coisa só! Um programa que adoro é ir à Praia Vermelha e no fim do dia ficar na mureta bebendo e vendo o anoitecer. Aliás, praia é sempre uma boa, e adoro ir no Leme – depois dá pra comer num dos lugares legais que existem pra lá, uma paixão recente é o quiosque do Aconchego Carioca, de noite o S Bistrô (antigo Salomé). Também adoro passear pelo Centro e seus prédios históricos, ir em botecos tradicionais como a Casa Paladino, passar no CCBB, no Real Gabinete Português de Leitura, nas igrejas, na orla Conde… Aliás, adoro simplesmente andar pela rua admirando os lugares dessa cidade. Eu cresci na Tijuca e acho que todo mundo tem que ir pelo menos uma vez na vida na Floresta da Tijuca (meus pais me levavam muito lá na infância, depois de adulta eu fui algumas vezes), depois vale emendar com os botecos maravilhosos de lá, tipo Momo ou Da Gema. Ah, e a dobradinha Bar Brasil + show no Circo Voador, amo! Já andei muito por essa cidade e hoje em dia por comodismo e a correria do dia a dia acabo ficando mais no eixo Tijuca-Centro-Zona Sul, mas o Rio tem coisas legais em todos cantos pra se fazer.

Gostou? Quer conhecer mais do trabalho da Kamille? Ela escreveu esse mês pela Trip, uma matéria incrível sobre o destaque e a mudança de simbologia que vem acontecendo em torno do nome de Exu, graças ao trabalho de artistas como Serena Assumpção, Karina Buhr, Luê, Xênia França e Baco Exu do Blues, entre outros. Vale muito a pena a leitura! Só clicar acima e conferir!

E fiquem de olho para o próximo perfil!

Foto: Bárbara Lopes

Acolhimento e sororidade: o poder das mulheres nas vidas umas das outras

 O que é sororidade? Muito mais do que apenas a união,como bem disse o portal Catarinas, é um pacto social, ético e emocional construído entre as mulheres. Laços que fazemos partindo do ponto que entendemos que juntas, somos mais fortes e que só a partir dessas alianças conseguiremos alcançar nossos objetivos em comum. No momento que deixamos de nos ver como inimigas e passamos a nos defender, nos aceitando como irmãs e companheiras de luta. E vamos ser sinceras, quantas lutas…

     Sororidade é um termo muito utilizado no feminismo moderno. Mas acho que muitas vezes se banaliza a importância e a força do que significa. Hoje em dia é tão fácil ser uma coisa nas redes e agir de outra maneira na nossa vida pessoal. Criamos personas, escrevemos textões, mas nos livrarmos do machismo imposto pela sociedade patriarcal em que fomos criadas e que cria abismos, um senso de competição e desconfiança entre mulheres é um trabalho diário, árduo. 

     Eu fui aprender e entender o que era sororidade de verdade, já adulta, graças a amizade de mulheres maravilhosas que a vida colocou no meu caminho e me acolheram cada uma de sua forma. Me ensinaram e me incentivaram a continuar a minha busca, porque até hoje sigo nela. Mas é preciso ressaltar a importância do poder do acolhimento, da conversa, da empatia, quando hoje em dia todo mundo só parece querer dar lacre. Essas mulheres me mostraram onde eu estava errando, me ouviram, abraçaram, choraram, riram comigo e pela primeira vez senti um espaço seguro. O que é algo tão difícil de se encontrar. 

      Hoje, uma dessas mulheres está passando uns dias aqui em casa. Faz cinco anos desde que nos conhecemos em um bar e a sua risada me contagiou. Ela me viu passar por um relacionamento abusivo e inúmeros empregos. Eu a vi mudar de cidade e decidir tomar um novo rumo na sua vida, hoje nos vemos menos, mas sempre é uma alegria, e sempre, não importa o que aconteça, sei que posso contar com ela e vice versa. Ela é uma das mulheres da minha rede de apoio. Onde eu encontro razão, verdade, carinho, humor, força e sororidade no sentido mais puro. 

     Minha caminhada no feminismo é de iniciante. Mas minha caminhada como mulher, como sobrevivente, é longa e marcada por resistência, pela sorte de ter encontrado pessoas que fizeram a diferença em momentos cruciais e a compreensão de entender que acolhimento e empatia são princípios fundamentais e poderosos. E que assim como foi crucial na minha caminhada esse movimento, levantar, apoiar e incentivar outras mulheres é meu dever. 

     Só quando construirmos uma aliança forte o suficiente, onde todas se sintam seguras e amparadas, de maneira interseccional e horizontalmente, nos entendendo e nos apoiando nas diferenças, poderemos nos chamar de irmãs de verdade. 

     Que mulheres fazem parte da sua rede de apoio?

Clube do Livro: O Corpo dela e Outras Farras

Assim que pensei na criação do blog e nos assuntos que queria falar, livros imediatamente me vieram a cabeça. Adoro ler. Tem épocas que consigo menos do que gostaria, mas ultimamente tenho tirado um tempo (afinal são literalmente tantas coisas nos chamando de todos os lados) para me dedicar a um livro e uma aventura nova.

Mas eu não queria fazer uma simples resenha e colocar uma pontuação de estrelas. Invés disso, prefiro fazer um convite. Eu estou atualmente no meio do livro O Corpo dela e Outras Farras de Carmen Maria Machado, que sugiro seja o primeiro do NOSSO Clube do Livro.

Carmen Maria Machado já foi publicada pela New Yorker, NPR, Best Women’s Erotica, Tin House, Guernica, Eletric Literature entre outros. Americana, filha de imigrantes latinos, foi finalista do Natinal Book Award por seu trabalho em O Corpo dela e Outras Farras.

Envolvente e extremamente bem construído. Uma narrativa que vai amarrando cenários, pontos, parágrafos e te enlaça no meio de tudo. 
Seja no primeiro conto, o ótimo “O Ponto do Marido”, onde além de nos enredar no seu rico universo de fábulas e histórias sobre noivas(temos que concordar que historicamente falando elas sempre se dão mal), casais que fizeram a escolha errada na beira de um rio, armas afiadas escondidas em doces de Halloween, ela narra sobre o desejo e a entrega em uma relação. Passando pela cumplicidade na formação de uma família, mas lembrando da importância de se ter algo só seu, mesmo que a outra pessoa não entenda. Dos limites que muitas vezes deixamos se perderem e com isso nos perdemos no caminho. 
“Inventário” é uma lista sincera que fala sobre os encontros sexuais da personagem, detalhando os que foram mais gentis, desconcertantes, com homens, mulheres, ambos; o nível de lembrança e impressão que deixaram, a intimidade, o perigo em certos casos, a intimidade conquistada, a tristeza ou decepção, corações partidos, enfim. Uma lista de quem viveu e está colocando tudo em ordem. A pergunta que fica no ar aqui, mas o livro responde é o motivo…
“Mães” me pegou de surpresa. Quando ela diz “eu te amo e não vou te machucar”, mas afirma que ambos são mentiras, e está dizendo aquilo apenas numa tentativa de acalmar o bebê e a si mesma, reconhecendo a distância entre as duas… me peguei torcendo por elas. E a cada grito, cada noite mal dormida, cada dificuldade, cada vez que o tempo passou e foi mais rápido, eu devorei as linhas sobre a vida da Mara, que deixou de ser só “a bebê” e ganhou, enfim, um nome. E que bonito, a cumplicidade, a força, o amor presente em cada uma dessas linhas.  Sim, uma história sobre amar para caralho alguém que você acaba de conhecer. Sobre ser mãe ou mães, e tudo o que isso significa. Real, forte, de dar nó no peito, colocar sorriso no rosto e no canto do olho. Emocionante. 

Moderno, honesto, prazeroso, acredito no poder do livro de Carmen e faço um convite para que se juntem à mim. Me digam o que acham deste e dos outros trabalhos dela. Se tem alguma sugestão para o Clube do Livro do mês que vem. Estou sempre disposta e ansiosa para ouvir!

E fica a pergunta, qual o último livro que você leu?

Setembro Amarelo: está tudo bem não se sentir bem

Estamos em pleno Setembro Amarelo, pra quem não sabe, uma campanha do Centro de Valorização da Vida iniciada em 2015 em todo Brasil de prevenção ao suicídio. Por isso vamos falar de felicidade compulsória, entre outras coisas.

Bom, basta rolar pelo seu feed e você vai ver muitas fotos felizes, hashtags positivas ou que tratam a existência de um momento ruim como algo de outro planeta (ou melhor da vida de qualquer um menos da sua). Ninguém quer falar, admitir ou abrir um diálogo real sobre não estar tão bem assim. Afinal, isso não é coisa de gente bem sucedida. Não gera likes. Você tem direito a ficar mal um dia, mas no outro é melhor postar uma foto numa paisagem paradisíaca ou com seu pet bem fofo, lembrando a todo mundo que aquilo foi passageiro.

A pressão para sermos perfeitos, termos vidas incríveis, tira a autenticidade das experiências e cada vez mais as pessoas da nossa geração reclamam que já não sentem prazer nessa corrida motivada por resultados e comparações.

Corpos. Empregos. Relacionamentos. Casas. Viagens. Filhos. Tudo é colocado em display num concurso sem fim nem medalhas. Apenas uma tentativa insana de provar o quão feliz você é, mesmo que por dentro esteja desmoronando. Como falar sobre dor, solidão, se até isso as pessoas querem julgar? O setembro pode ser amarelo, mas a depressão, assim como os diversos motivos que levam alguém a considerar o suicídio tem diversos tons. Impossível colocar numa caixa, medir, comparar. Aliás, a primeira coisa a se entender é que dor NUNCA se compara. Precisamos ter mais empatia.

Parar com esses #goodvibesonly e oferecer espaços seguros onde as pessoas possam de verdade se sentir à vontade para conversar, trocar, pedir ajuda. Ninguém vive só de goodvibes nem de bad. É importante passar e reconhecer as mudanças, e acolhê-las. A vida não se resume a um bom filtro de Instagram. E definitivamente não se resolve com ele, não importa o quanto queiramos. Então, que tal fazer um esforço real nesse mês? Nem romantizar o sofrimento com fotos bonitas para ganhar atenção nem ostracizar os que podem estar num momento difícil. Só através da sinceridade e de mostrarmos nosso lado mais vulnerável que tantas vezes fica perdido em meio a tantos artifícios, vamos conseguir promover mudança.

Fale com um amigo. Ouça. Pergunte. Esteja mais presente na vida de quem você conseguir. De verdade. Nem sempre vai ser fácil. Mas vale a pena. Porque em geral, as pessoas que realmente estão precisando de ajuda, nem sempre conseguem pedir essa ajuda. E não deixe só pra setembro.

Síndrome de Fleabag

Perder-se também pode ser o caminho, ou pode ser só uma desculpa para não enfrentá-lo…

Mas vamos começar do começo. Você já assistiu Fleabag? A série escrita, dirigida e estrelada pela brilhante Phobe Waller Bridge que interpreta a personagem do título, em sua busca por entender e conseguir equilibrar controle no seu dia a dia. A série está em sua segunda temporada e pode ser vista na Amazon. Com diálogos inteligentes, bem construídos, situações que lidam com dramas familiares, ser uma mulher adulta sem saber navegar ou não querer navegar tão bem as convenções, perda, luto, amizade, sexo casual (bom, ruim, entediante, com direito a comentários da protagonista que sempre quebra a quarta parede e nos dá sua opinião).

Fleabag sempre nos aproxima e nos traz pra dentro do seu mundo e da sua cabeça, um lugar nem sempre fácil de estar, mas isso é parte do apelo. Ame-a, odeia-a, mas é irresistível assistir. E de certa forma se identificar. É humano, e a falta de excessos em cenários, figurinos, deixa ainda mais nítido o quão brilhante a atuação e o roteiro são. Você sente que de alguma forma já viveu aquelas situações, teve aqueles jantares em família, ou conhece uma família como aquelas… é íntimo e ao mesmo tempo, escancarado para o seu prazer naquela meia hora.

Enquanto jura que está no comando dos homens em sua vida, do álcool que consome, das escolhas que faz, suas escolhas vão revelando sua vulnerabilidade, e o lado que ela tenta tanto esconder, mas que nós, como espectadores recebemos acesso. Um retrato muito bem construído do que é tentar se convencer de estar no controle quanto você mesma está do avesso e precisa se apegar a algo.

E seja porque você se identifica ou não, porque quer ser amiga dela ou nunca se imaginaria com alguém do tipo, é muito importante uma série com uma protagonista mulher cujo foco é algo mais do que se apaixonar e que tem complexidades, imperfeições, sentimentos, profundidade, relações e aspirações que vão além de ser uma manic pixie girl.

Fleabag é apaixonante. Ácida, frágil e forte ao mesmo tempo, do tipo “foda-se, vou usar a mesma roupa ” mas que capricha no batom vermelho. Vai ligar bêbada numa terça pro contatinho e se não tiver afim quando ele chegar, deixá-lo do lado de fora. É livre e prisioneira da sua própria liberdade. Em queda livre, um poço de contradições. Mas vale cada segundo!

E você? Já assistiu? Ou tem alguma outra série que é o seu vício?